quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Aborto na legislação angolana

Padre Martinho Kahala
O aborto, em Angola, está tipificado como crime, independentemente do motivo e da fase de gestação em que ocorrer. O Artº 358º do Código Penal vigente estabelece o seguinte: “aquele que, de propósito, fizer abortar uma mulher pejada, empregando para este fim violências ou bebidas, ou medicamentos, ou qualquer outro meio, se o crime for cometido sem consentimento da mulher, será condenado a pena de prisão maior de dois a oito anos”.
A pena acima referida é também aplicada àquele que cometer o crime com consentimento da mulher, bem como à mulher que consentir e fizer uso dos meios subministrados, ou que voluntariamente procurar o aborto a si mesma, seguindo-se efectivamente o mesmo aborto (§1º e §2º). O facto de a mulher cometer o crime para ocultar a sua desonra, não afasta o crime, apenas reduz a moldura penal: será punida com pena de prisão, isto é, de 3 dias a dois anos (§3º).
Incorre, respectivamente, nas penas acima referidas, agravadas segundo as regras gerais, o médico ou cirurgião ou farmacêutico que, abusando da sua profissão, tiver voluntariamente concorrido para a execução do supracitado crime, indicando ou subministrando os meios (§4º).
Nos termos do Decreto-Lei nº 36171, de 29 de Julho de 1941, publicado no Boletim Oficial nº 22/947, no seu Artº 10º, o §4º do artigo que acabamos de analisar aplica-se a todo o pessoal auxiliar da medicina e não apenas a médicos, cirurgiões e farmacêuticos.
Podemos, assim, afirmar que a legislação angolana, actualmente em vigor, concorda com a doutrina católica em relação ao aborto, condenando severamente a sua prática. A proliferação do aborto, hoje, em Angola é mais um problema sociológico do que jurídico. Por outras palavras, sendo claramente de condenação, a posição do legislador angolano, como se justifica que tal prática em vez de diminuir cresça cada vez mais? Que consciência religiosa e do respeito pela vida marca a sociedade angolana do nosso tempo? Perguntas como estas fazem-se não só em relação ao aborto, mas em relação a todos os outros crimes duramente punidos pelo legislador. Citemos o exemplo do homicídio voluntário: quanto mais pessoas vão para as cadeias, mais cresce o número de homicídios no dia-a-dia dos angolanos! Temos que reconhecer que a nossa sociedade perdeu muitos dos seus valores. A recuperação desses valores passa por um trabalho que exige um esforço de todos os sectores da sociedade e os frutos desse trabalho só depois de muito tempo se tornarão visíveis.
Voltando à questão do aborto, a discussão se levanta a partir do Projecto do Novo Código Penal que, no seu Artº 144º, nº 1, al. C), liberaliza o aborto que ocorrer nas primeiras 10 semanas. Se partirmos do pressuposto de que a vida humana é um processo que tem o seu início no momento da concepção (até hoje, a Biologia não afirmou coisa contrária), não se percebe por que é que se permite a sua eliminação nas primeiras 10 semanas. O mesmo número, já noutras alíneas, permite o aborto praticado com base em fundamentos contrastantes com a moral católica. Mas, reservamos o comentário a respeito delas para os próximos números.

Sem comentários: