quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

EDUCAÇÃO COMUNICATIVA ANGOLANA NA REALIDADE “ONDJANGOTCHIWIANA”: diálogos com Paulo Freire [1]

Martinho Kavaya [2]
PPGE/UNISINOS - PPFE/FaE/UFPel
Gomercindo Ghiggi[3]
PPGE/FaE/UFpel


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RESUMO

Um seminário realizado em Angola, com professores em formação, na Universidade Católica de Benguela, Curso de Pedagogia, é o que dá origem a este texto. É um trabalho que se enquadra no movimento de pesquisa realizado pelo doutorando Martinho Kavaya, em diálogo com o orientador Gomercindo Ghiggi. A temática do Seminário foi a Educação angolana em tempos actuais em diálogo com o Ondjango, o Otchiwo e os Círculos de Cultura. Trata-se da busca de uma educação libertária e libertadora em Angola a partir da realidade cultural e em denso diálogo com a biobibliografia de Paulo Freire. Trata-se de uma proposta de reflexão de dupla mão, pois, com a experiência dos Círculos de Cultura no Brasil pensamos na educação angolana, desde o solo do centro sul. Trata-se de uma proposta que mais de existir um expositor, pensamos propor mediador que permitisse aos professores pronunciarem a própria palavra para que, com propriedade pudessem pronunciar o próprio mundo angolano, pensando na educação promotora da libertação. Estamos nos referindo de uma educação dialógica.

Palavras-chave: Educação comunicativa, Educação Ondjangocthiwiana, Angola, Freire
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RESUMEN

EDUCACIÓN COMUNICATIVA ANGOLEÑA EN LA REALIDAD "ONDJANGOTCHIWIANA": DIÁLOGO CON PAULO FREIRE

Un seminario que se tenga realizado en Angola, con los profesores en formación, en la Universidad Católica de Benguela, curso de pedagogía, es lo que da lugar a este texto. Es un trabajo que se inscribe en el movimiento de la investigación llevada a cabo por el Prof. MS. Martinho Kavaya en el diálogo con el supervisor Prof. Dr. Gomercindo Ghiggi. El tema del seminario fue sobre la Educación de Angoleña en tiempos actuales dialogando con el Ondjango, el Otchiwo y los círculos de la cultura. Trata-se de una búsqueda de una educación liberadora y libertaria en Angola a partir de la realidad cultural y denso diálogo con la biobibliografia de Paulo Freire. Esta es una propuesta de reflexión de la doble mano, porque la experiencia de los círculos de la cultura en Brasil tienden a mostrar e reflexionar en la educación en Angola desde la tierra al centro del sur. Se trata de una propuesta que supone no un expositor, más se propone solamente a la mediación docente, quiero decir que los profesores se presentan como mediadores de la lectura de la palabra y del mundo de la vida. Para el efecto, les profesores en formación san invitados a la pronunciación, con la propiedad propio mundo Angoleño, pensando en la educación que poda promover la liberación. Nos referimos a una educación dialógica y libertadora.

Palabras-clave: Educación de comunicación, Educación Ondjangocthiwiana, Angola, Freire
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1. Primeiras palavras

Na esteira do Seminário referido no resumo acima, tornou-se importante falar de uma educação comunicativa na actualidade angolana que partisse do mundo da vida dos educandos, isto é, que tivesse no seu bojo a acção comunicativa como bem o salientavam Habermas (1987) e Freire (1991; 2000; 2001; 2002; 2003a.b.c; 2004a.b; 2005), actualizando-a na proposta pedagógica. Porém, interessou-nos, durante as discussões, aterrisar sobre realidade educacional angolana, sobretudo na provincia de Benguela, concretamente na cidade do Lobito, bairro da Cabaia. O Seminário contou com mais de 50 professores/estudantes, dos quais um comerciante (ambulante), um do Ministério da Justiça, um do Ministério do Interior, cinco de empresas privadas e os demais eram docentes. Aqui o diálogo toma o lugar cimeiro.

Partindo da perspectiva dialógica, a educação foi apresentada, neste contexto, como “um ato de amor, por isso, um ato de coragem” (FREIRE, 2003a, p.104). Uma educação que nao tivesse medo de discutir, de fazer a análise da realidade educacional local e global e das consequências subjacentes desta educação; uma educação que não fugisse da discussão criadora do ato de sabe nomear problemas, sob pena de criar uma farsa educacional. Para isso é fundamental rever as formas diversas de educação bancária, identificar as próprias formações lincensiosas. Se primar pelo autoriarismo e pelo despotismo pedagógico, ou seja, para a educação bancária, diatanciada de uma educação criadora e con-criadora de um mundo novo, estaremos ante o seguinte dliema: “Como aprender a discutir e a debater com uma educação que impõe? Ditamos idéias. Não trocamos idéias. Discursamos aulas. Nao debatemos ou discutimos temas. Trabalhamos sobre o educando. Não trabalhamos com ele.” Ou seja, para Freire, “impomos-lhe uma ordem a que ele não adere, mas se acomoda. Não lhe propiciamos meios para o pensar autêntico, porque recebendo as fórmulas que lhe damos, simplesmente as guarda. Não as incorpora porque a incorporação é o resultado de busca de algo que exige, de quem o tenta, esforço de recriação e de procura. Exige reinvenção.” (id).

O método proposto na expêriencia aqui citada de Angola é o dialogal, não muito usual. Pensamos neste método, pois poderia proporcionar aos docentes do centro sul de Angola, em Benguela, meios suficientes para a superar ou repensar atitudes mágicas ou ingênuas, diante da realidade (id, p.115). O diálogo, aqui, é visto como relação horizontal, enquanto horizontalidade relacional, que permite crítica e gera criticidade; que se nutre de amorosidade, humildade, esperança, fé e confiança. Só através do diálogo é possível falar da comunicação. Freire, trazendo Jaspers, mostra que “o diálogo é indispensável caminho, (...), não somente nas questões vitais para a nossa ordenação política, mas em todos os sentidos do nosso ser.” E Freire afirma que o diálogo se realiza de a “... crença no homem e nas suas possibilidades, pela crença no homem e nas suas possibilidades, pela crença de que somente chego a ser eu mesmo quando os demais cheguem a ser eles mesmos.”

O diálogo se opõe ao antídiálogo, que atravessa a quase totalidade da formação em escolas angolana no contexto histórico-cultural, ainda presente em nossa cotidianidade. Em uma relaçao antidialógica a relação nao se orienta mais pelo principio de com e sim de A sobre B. É uma relação desamorosa, acritica, petulante, vaidosa e orgulhosa; é uma relaçao desesperançosa, arrogante, auto-suficiente, antipática e incomunicacional. A pedagogia da comunicação removencedora do desamor, da acriticidade e do antidialógico, torna-se referência central à educação angolana. Trata-se de uma pedagogia que visa o outro com quem o diálogo acontecerá, pensando na vida, no mundo, no homem e na existencialidade.

2. Pedagogias que brotam dos Círculos de Culura, do Ondjango e do Otchiwo

Para fazer uma abordagem de uma educação comunicativa angolana em diálogo com a perspectiva educacional discutida por Freire, centralmente, destacaremos pedagogias encontradas nos Círculos de Cultura, no Ondjango e no Otchiwo, estes últimos espaços vitais de diálogo no centro sul angolano, para, em seguida, reflectirmos a realidade educacional angolana. Afinal, o que queremos é pensar a educação para uma Angola em processo de democratização, ainda com grandes resquícios da educação bancária, dominadora, e silenciadora das vozes dos sem vez.

A). Pedagogias do ondjango:

Encontro vital ensinante e aprendente,
 Diálogo,
 Leitura de mundo,
 Actuação prática,
 Acústica
 Oralidade
 Iniciação sociocultural e política
 Gestão da vida comunitária e política
 Luta pela vida
 Lendária
 Parábolas
 Dança
 Simbolismo
 laboral
 comunhão
 Interacção
 Solidariedade
 Amorosidade

B). Pedagogias do otchiwo:

 Encontro vital aprendente e ensinante
 Encontro pedagógico sobre o cuidado, a valorização, a protecção, a defesa e a administração da vida;
 Gestão educacional doméstica
 As regras de conduta de uma mulher madura
 O ensaio para o ser mulher como expressão da maternidade da terra e da humanidade,
 Sexual da familia
 Lendária
 Parábolas
 Dança
 Simbolismo
 Acústica
 Oralidade.
 Laboral
 Comunhão
 Interação
 Solidariedade
 Amorosidade

C). Pedagogias dos Círculos de Cultura em Freire:

 Encontro ensinante e aprendente
 Dialógica
 Acústica/Escutar/ouvir
 Letrada ou leitura do mundo
 Escrita da palavra (alfabetização)
 Autorizadora:dizer a palavra
 Libertadora e libertária
 Profética: anúncio/denúncia.
 Leitura de mundo-palavra,
 Práxis
 Conscientizadora
 Esperança/Páscoa
 Pergunta
 Prática pedagógica,
 Autônoma
 Diretiva X licenciosa
 Prática da liberdade
 Sonhadora/utópica
 Construtora de sujeitos.
 Amorosa
 Acção de e em equipa,
 Solidariedade
 Comunhão
 Interação

Entendendo a amorosidade como categoria essencial para pensar uma educação diferente da habitual (dominadora, bancária, autoritária e escravagista) em Angola, é central, como reflete Freire (2004), amar o mundo, a vida e os homens, para fazer uma educação dialogada, pois, segundo o educador, “se não amo o mundo, se não amo a vida, se não amo os homens, não é possível o diálogo” (id, p.80). Este diálogo supõe, de igual modo, a humildade e não arrogância, supõe o encontro dos humanos como tarefa comum. Temos, diante de nós, uma arte feita tarefa. Trata-se de educar educandos e educandas, homens e mulheres, para que se tornem autônomos e construtores de uma sociedade radicalmente humana, justa, solidária e livre. Trata-se de se fazer uma educação que sirva como prática libertária e democrática. Para o efeito, torna-se peremptório entender que na nova cultura de aprendizagem, nós somos aprendizes e mestres (POZO, 2002). Assim, quatro pontos são norteadores desta abordagem: (a) Aprender e ensinar, constituem dois verbos do trabalho docente para a aprendizagem; (b) As características definidoras de boa aprendizagem; (c) Os quatro pilares da educação – a partir da UNESCO; (d) A educação na realidade vital angolana/benguelense: qual? Que fazer? Como fazer?

2.1. “Aprender e ensinar constituem dois verbos do trabalho docente para a aprendizagem”

Aprender e ensinar são dois verbos que devem conectar-se, mas que nem sempre se conjugam, tampouco dialogam no processo da actuação profissional docente. A ideia central deste ponto consiste em contribuir para que o sentido e a eficácia da aprendizagem, fazendo com que alunos e professores se conscientizem das dificuldades que enfrentam e dos caminhos existentes para superá-las. O fim último do trabalho docente, nesta perspectiva, consiste em tornar eficaz a aprendizagem/ensino.

No caso de Benguela, entretanto/Angola, isso só se torna possível com a qualificação do ambiente de trabalho; a disponibilidade de equipamento e material acadêmico; a formação permanente e atualizada dos professores e dos formadores; o reconhecimento e estímulos do corpo docente; a montagem de uma biblioteca geral e atualizadal na cidade, capaz de responder aos desafios acadêmicos e em cada instituição escolar para o atendimento do seu público; do incentivo à pesquisa e leitura aos alunos e professores; a garantia da democratização escolar (participação, diálogo, libertade e respeito), de modo que a escola seja um espaço onde alunos(as), professores(as), funcionários(as), familiares e sociedade civil tenham voz e vez.; enfim, o exercitar-se para o controle social onde o envolvimento total da sociedade se torne uma realidade, evitando, assim, anomalias de vária ordem.

Nesta óptica, aprender e ensinar são dois verbos que tendem a ser conjugados juntos, embora nem sempre seja assim, pelo fato de existir aprendizagem sem ensino, ensino sem aprendizagem (POZO 2002, p.55-68) e ensino e aprendizagem concomitantemente. Estas aprendizagens, segundo o autor citado (ibid, p.80) e segundo nosso entender, podem coexistir, isto é, não pode existir aprendizagem sem ensino nem ensino sem aprendizagem.

Porém, é importante a compreensão de que todos somos aprendizes e ensinantes, uns com mais experiências do que outros. Seja como for, a percepção de Pozo pode ter algumas lacunas se olharemos pela realidade educacional popular onde muitas vezes se aprende sem quaisquer intervenção de terceiros, somente pela observação e ação, conforme diz o ditado popular latino “aprende-se fazendo”, isto é, “fabricando fit faber”. E a este respeito Freire mostrar-nos-ia que o caminho só se faz caminhando. Aqui se aprende com a experiência de vida, isto é, com as lutas feitas de dores, alegrias, derrotas e conquistas, onde as mediação e a diretividade de gente com experiência teórico-prática, é algo de grande valia.

2.2. Características definidoras e diferentes níveis de análise para uma boa aprendizagem/ensino.

Queremos, neste ponto, elencar três características definidoras de uma boa aprendizagem. Porém, interessa saber que não são as únicas, mas, na realidade angolana, as mesmas são de extrema importância. Com efeito, eis as características de tal aprendizagem: (a) a aprendizagem/ensino deve produzir mudanças duradouras; (b) a utilização do que se aprende/ensina e (c)as novas situações, pois: - vivemos num mundo de mudanças.

Neste sentido, torna-se importante que o professor/aprendiz não esteja aquém destas mudanças; - nos tempos hodiernos não se admite que o professor(a) aprendiz(a) não tenha mínimas noções das novas tecnologias de comunicação e informação (TIC’s), tais como a informática, a Internet e outros equipamentos afins como artefatos para o trabalho e também para a pesquisa; daí a necessidade dos professores(as) de Angola, sobretudo os de Benguela se empenhem na familiarização com estes recursos que a atualidade oferece, realizando cursos, atualizações permanebtes e seminários para o efeito. Acima de tudo a curiosidade aprendente deve interessar a todos; (c) a prática do mundo da vida do aluno deve adequar-se ao que se tem de aprender como consequência directa da prática realizada.

Para Pozo (id, p.82), no estudo de aprendizagem é possível identificar quatro planos distintos que em outras palavras chamamos de níveis de aprendizagem: (a) a conexão entre unidades de informação; (b) a aquisição e mudança de representações; (c) a consciência reflexiva como processo de aprendizagem; (d) a construção social do conhecimento.

A aprendizagem/ensino acontece a partir de elementos como (a) motivação; (b) atenção; (c) recuperação e transferência das representações presentes na memória como consequência das aprendizagens anteriores; (d) consciência e o controle dos próprios mecanismos de aprendizagem constituem um processo transversal aos anteriores.

Dese modo, o desafio consiste em repensar os nossos sistemas educativos, tendo em vista a globalização da economia e as situações locais concretas. Os sistemas que herdamos da colonização mantiveram-se geralmente mais ou menos intactos, com intuito de preservar as normas, mais ilusórias do que reais, das pequenas elites que recebiam uma formação idêntica à que era dada na metrópole, enquanto a grande maioria ficava privada de quaisquer formas de educação moderna. A educação precisa estar a serviço de uma finalidade. Cabe, porém à África e aos africanos, especialmente aos angolanos definir qual é essa finalidade.

A educação deve desempenhar um papel crucial no desenvolvimento económico; instaurar e definir os valores que farão de Angola em particular e da África em geral um país e concomitantemente um continente política e culturalmente unido sem ferir a sua rica e enriquecedora diversidade cultural, onde se viva em democracia africana feita de familiaridade, hospitalidade, harmonia, diálogo, tolerância, respeito, solidariedade humana e aprendente, voltados para o futuro promissor.

Identificada, assim, a finalidade da educação, a África, Angola, Benguela e seus habitantes poderão definir o tipo de educação que melhor se adapte ao seu desenvolvimento. Esta finalidade deve ser definida mediante a realidade concreta do mundo da vida africano, angolano, da aldeia global e do mercado mundial.

Portanto, a necessidade de se considerar ao quatro pilares da educação, segundo a UNESCO (DELORS, 2003, p.89-99). Acima de tudo se entenda a cultura africana e angolana como aquela que se define pelo conceito da familia que respeita, defende, luta, acolhe e alimenta verdadeiramente a vida em todas as suas dimensões.

2.3. Os quatro pilares da educação:

Aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser, são os quatro pelares da educação como definiu o Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI.

Aprender a conhecer implica, centralmente, no domínio dos instrumentos do conhecimento para a aprendizagem da compreensão do mundo circundante. Aprender a fazer, ou seja, implica competências do educador, indissociável do aprender a conhecer, ligada à formação, como ensinar o aluno a pôr em prática seus conhecimentos. Aprender a viver juntos, aprender a viver com os outros, tratada abertura ao outro, da compreensão mútua e do viver em paz. Aprender a ser, que significa trabalhar para a educação do mundo desumanizado, educação que contribua para o desenvolvimento total da pessoa, com todas as suas potencialidades – corpo e espírito; inteligência; sensibilidade; espiritualidade; sentido estético; responsabilidade ética, ecológica e pessoal etc.

3. Resquícios e saídas à realidade educacional angolana.

A realidade educacional de Angola é marcada por mortes e sacrifícios e grandes lutas e vitórias. Num momento histórico em que os movimentos político-militares estavam, absolutamente, em activo, a escolarização, apesar dos pesares jamais conheceu o seu ocaso, tanto na cidade quanto no interior. É motivo de louvar o empenho e o desempenho de todos aqueles e aquelas que estavam na vanguarda educacional.

Porém, educação, não raras vezes, foi ferida pelas sequelas do momento vivenciado. O ambiente pedagógico transformou-se num cancro (cancer) maligno: (a) a escola foi invadida pelo nepotismo pedagógico; e (b) a precariedade da educação desde as fases iniciais favorece para o deficit rendimento dos alunos nas fases avançadas, pelo que o investimento escolar deveria ser feito para as fases iniciais.

As saídas para superar o modelo posto, em denso diálogo com Freire, e desde a experiência do Ondjango, do Otchiwo e dos Círculos de Cultora, podem ser buscadas em novas perspectiva da educação, apostando na educação que faça da pessoa um ser livre e dilógico. Sob a perspectiva pedagógica a aposta se oriente na educação que estimule a capacidade crítica. Do ponto de vista dos princípios curriculares, é umportante apontar numa metodologia dinâmica estimuladora da construção do conhecimento e não na sua reprodução apenas.

À guisa de conclusão pode-se afirmar que, para a educação angolana, é fundamental apontar para a disponibilidade e abertura ao diálogo na ação docente. O apelo ao respeito pela diferenças socioculturais, etnoliguísticas e geopolíticas e a coerência entre a palavra dita e a palavra escrita permite-nos o encontro dialógico.
Nesta ótica, torna-se urgente entender que “como professor não devo poupar oportunidade para testemunhar aos alunos a segurança com que me comporto ao discutir uma temática, ao analisar um fato, ao expor minha posição em face de uma decisão governamental. Minha segurança não repousa na falsa suposição de que sei tudo, de que sou o ‘maior”. E Freire continua: “minha segurança não se funda na convicção de que sei algo e de que ignoro algo a que se junta a certeza de que posso saber melhor o que já sei e conhecer o que ainda não sei. Minha segurança se alicerça no saber confirmado pela própria experiência de que, se minha inconclusão, de que sou consciente, atesta, de um lado, minha ignorância, me abre, de outro, o caminho para conhecer” (FREIRE, 2007, p.135-136).

Para Freire, a abertura para a investigação, à subjetividade e à intersubjetividade devem ser uma constante no itinerário do pesquisador, por isso ele afirma: “me sinto seguro porque não há razão para me envergonhar por desconhecer algo. Testemunhar a abertura aos outros, a dospinibilidade curiosa à vida, a seus desafios, são saberes necessários à prática educativa. Viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em vez, de acordo com o momento, tomar a própria prática de abertura ao outro como objeto de reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente” (ibid).

Assim, a razão ética de abertura, seu fundamento político e sua referência pedagógica; a experiência da abertura como experiência fundante do ser inacabado; a abertura ao mundo e aos outros, encontra no diálogo ensinante e na curiosidade aprendente e inquietante um dos caminhos para a criação e recriação de uma sociedade nova.

Cada um de nós, seja docente da rede pública, membro dos movimentos sociais ou populares, agente das ONG’s e/ou OG’s ou instituições sócio-religiosas, econômico-culturais, somos convocados a repensar nosso ser e nossa caminhada.

A experiência vivenciada em Angola nos ensinou a repensar nosso fazer a educação na cotidianidade. Afinal estamos propondo uma educação ondjangotchiwiana (encontros ensinantes e aprendentes homem/mulher para, em conjunto refletirem no futuro comum da educação libertadora e emancipadora) que com intensidade possibilite diálogos e curiosidades (ensinantes e aprendentes), mediatizados pelo ancião/anciã, pelo pronunciamento conjunto do mundo da vida e da própria palavra lida e escrita.

Tal atitude ajudará na produção da ciência humana e humanizante num mundo que almeja a radical democratização de mentes, de instituições geopolíticas, socioeconômicas, culturais, intelectuais, religiosas etc.

NOTAS

[1] Seminário de formação realizado na Universidade Católica de Benguela (06/11/2008) para os discentes de Pedagogia da Comunicação, matéria leccionada pelo Professor Pe. Kandandji.

[2] Formado em filosofia, teologia, Serviço Social (UCPel), Mestre e Doutor em Educação no PPGE/ UFPel e Doutorado “Sandwiche/SWP” no PPGE da UNISINOS. E-mail: makavaya@yahoo.com.br Orientador Prof. Dr. Danilo Streck. E-mail: dstreck@unisinos.br.

[3] Professor de Graduação e do PPPGE (Mestrado e Doutorado) da FaE/UFPel. Pesquisador com apoio do CNPq, da CAPES e da FAPERGS. E-mail: gghiggi@terra.com.br

REFERÊNCIAS

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FREIRE, Paulo. Conscientização. Teoria e Prática da libertação. Uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Centauro Editora, 2001, 102p.

FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo leitura da palavra (Trad. Lólio Lourenço de Oliveira). 3ª Ed. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2002, 167p.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 27ª. Ed. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2003a, 158p.

FREIRE, Paulo. Educação e mudança. (Pref. Moacir Gadotti e trad. Moacir Gadotti e Lilliam Lopes Martin). 27ª. Ed. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2003b 79p.

FREIRE, Paulo & GIMARÃES, Sérgio. A África ensinando a Gente: Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2003c 228p.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 38ª. Edição. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 2004a 189p.

FREIRE, Paulo. À sombra dessa mangueira. São Paulo: Ed. Olho d’Água, 2004b, 120p.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança. Um reencontro com a pedagogia do oprimido. (Prefácio de Leonardo Boff. Notas de Ana Maria Araújo Freire). 12ª. Ed. São Paulo: Ed. Paz e Terra S/A, 2005, 245p.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonimia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2007, 148p.

GAIRIN, Joaquim. O projecto educativo o desenvolvimento do curriculum. In, ÁLVAREZ, Manuel e al. Projecto educativo da escola (trad. Daniel Ángel Etcheverry Burguño). Porto Alegre: Artmed, 2004.

HABERMAS, Jurgen. Teoria de la accion comunicativa – Tomo I Racionalidad de la acción y racionalización social (versión castellana de Manuel Jiménez Redondo). 4ª ed. Altea: Taurus, 1987, 517p.

POZO, Juan Ignacio. Aprendizes e Mestres: A nova cultura da aprendizagem (trad. Ernani Rosa, Consultoria, Supervisão e revisão técnica de Eduardo Mortimer). Porto Alegre: Artmed, 2002

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